segunda-feira, agosto 28, 2006

Recordação de Mombaça

É uma daquelas historietas do tempo dos impérios. Reza a mesma que uma expedição holandesa a Mombaça, com o legítimo intuito de resgatar a praça do domínio português, encontrou resistência inesperada por parte da guarnição local.

Na esperança de evitar uma luta prolongada que depauperasse as suas forças, tornando a futura ocupação impraticável, o comandante flamengo propôs ao seu correspondente português que se resolvesse a questão por meio de combate singular; escolhia-se o mais forte entre cada um dos exércitos e quem ganhasse levava a cidade para o seu lado.

Dizem que a isto o 'nosso' comandante concordou, mas com uma ressalva: que o outro escolhesse não um mas dois soldados para a contenda "pois é sabido que um português vale pelo menos por dois holandeses".

Esta estória de basófia vem a propósito das últimas novidades de Timor.
Apesar da presença em território timorense de mais de 2000 soldados e polícias australianos, estes não só demonstraram ser incapazes de reestabelecer a ordem pública como até muitas vezes se vêem na contingência de solicitar a ajuda de alguns dos cerca de cento-e-tal militares da GNR para ali enviados pelo governo português.

Sem pôr em causa a competência da Guarda na resolução de situações de controlo de multidões, parece-me irrazoável que tanto músculo austral se desperdice em operações de voyeurismo impertinente.

Será por isso que Mombaça ainda ficou nossa por mais uns anos?

quarta-feira, agosto 23, 2006

Marbella, mal perdes por esperar

Tem 48 anos e vem de França, onde vive do rendimento mínimo garantido. Depois de perjúrio (queixou-se de violação), é suspeita de homicídio do dono da embarcação onde viajava, motivado pelo roubo da mesma. Supõe-se que mantinha relação de incesto com o cúmplice, já que se afirma sua irmã.

Antes do naufrágio, parece que "C.C." (como a imprensa lhe chama) escreveu um postal à mãe onde se manifestava encantada com o país, o qual lhe recordava "a Espanha de há 30 anos".

Mal posso esperar pela desafectação da reserva natural da costa vicentina e o navio de progresso que finalmente aqui aportará.

Vox dei

No Público de hoje, à pergunta "concorda com o envio de tropas portuguesas para o Líbano?", Delmira Mateus,
artesã de 56 anos, respondeu com toda a cidadania:

"Acho que, se as tropas vão, é porque é de livre vontade. Ninguém as obriga a ir. Mas, se eu tivesse um familiar meu na tropa, não queria que fosse."

Esta foi a melhor tirada contra o fim do S.M.O. que eu já ouvi em anos.

sábado, agosto 19, 2006

Gases anglo-saxónicos e o restaurador Oilex

No seu blogue, Paulo Querido destacou há dias que

"O primeiro-ministro australiano John Howard anunciou medidas de um plano mais vasto para diminuir os efeitos nocivos da excessiva dependência energética do petróleo. Entre elas avulta o financiamento da conversão dos veículos para o gás liquefeito, GPL. (...)"

Por sua vez, no Causa Nossa, Ana Gomes que deu-nos conta de quem aquece as costas aos australianos quando estes rejeitam liminarmente a recomendação de Kofi Annan para uma missão militar da ONU em Timor-Leste.

Ora, porque razão não haveriam os E.U.A. e o Reino Unido de o fazer já que do que interessa também vai sendo tudo decidido?

O que é preciso é instabilidade para que os rapazes da Oilex consigam trabalhar em paz. E os timorenses que se danem.

sexta-feira, agosto 18, 2006

"Sátira de bloguista leva empresa a suspendê-lo"

Dava um belo título. Mas não é bem assim.

atenção: isto hoje vai corrido a linques para tudo e tudo

A notícia vem no Independent de hoje.

Parece que o senhor em questão, Inigo Wilson, escreveu num blogue do partido conservador (ConservativeHome) um pequeno glossário com o qual pretendia ridicularizar alguns dos chavões usados diariamente pela esquerda britânica bem-pensante.

Esperava-se a mesma reagisse, com a falta de sentido de sentido de humor que lhes é característica, mas quem acabou por liderar a campanha contra a anedota foi um outro website, desta feita o do forum da Comissão de Assuntos Públicos Muçulmanos, Muslim Public Affairs Committee (a tradução está saloia, eu sei), incitando o público a queixar-se ao empregador do sr.Wilson, a Orange Mobile Company (!).

Os senhores da Orange ainda se tentaram defender argumentando que nada tinham que vêr com as opiniões pessoais de um assalariado seu. Mas o estigma de 'racista' com que a empresa se viu ameaçada parecia ter mais força e assim acabou por suspendê-lo das suas funções de... relações públicas.

Só que, ao que consta, os lóbistas, longe de causar algum incómodo, até acabaram por fazer um favor ao operador de telecomunicações. Ora vejam...

quinta-feira, agosto 17, 2006

O inefável JoaoMiranda

sim, esse mesmo

Aqui, no Verdade ou Consequência, e em primeira mão, o site do profissional.

O multi-culturalismo

Um amigo contou-me a seguinte bizarria, passada há duas semanas numa free house em Inglaterra.

'Era um quadro encantador: alguns ingleses de ambas as idades e todos os sexos acabavam de regressar de uma dessas manisfestações espúrias contra o "terrorismo israelo-americano".

Sentaram-se à minha frente com a disposição aparente de dever cumprido. Entre eles, uma mulher repelente vestia uma t-shirt com piadinha cáustica anti-bush. Havia também um barbas envergando com [duvidoso] orgulho, o amarelo e verde com a AK-47 e tudo do logo do Hezbollah.

Depois de algumas pintas de bebidas fermentadas, uma das mulheres do grupo, companheira de outras causas, colocou-se em dúvida e começou a falar qualquer coisa que não percebi acerca dos direitos das mulheres muçulmanas. Não deve ter sido considerado
kosher pelos outros pois foi imediatamente interrompida pela camarada anti-bush: "Desculpa mas estás a ser racista. Não podes julgar o mundo pelos teus olhos ocidentais. É uma outra cultura, precisamos respeitar a sua especificidade. E não penses que nós aqui estamos melhores!"

Puxei de um cigarro e provoquei a tosse convulsa daquela mesa ainda antes de o acender.
"Não," pensei, "de facto, não estamos".
'

O Síndroma de Jerusalém

No artigo Proche-Orient : les illusions calamiteuses d'une géopolitique surréaliste, publicado no Figaro de 8 de Agosto, André Glucksmann levanta oportunamente a questão da hiperbolização das tragédias no Médio Oriente na percepção da opinião pública mas desilude quando acaba por perder-se em considerações de umbigo de mundo.

O que o filósofo francês parece esquecer é que a culpabilização ocidental em torno da questão palestiniana também se alimenta do conflito entre a suposta superioridade moral europeia e o ultramontismo norte-americano - uma das muitas heranças da Guerra Fria da qual ainda vai custar para nos livrarmos.

Quando 200 000 muçulmanos são mortos no Darfur por outros muçulmanos, como refere Glucksmann, quem no Ocidente se dá ao trabalho que a indignação obriga já que nenhuma potência mediática, daquelas que despertam paixões nos moralistas anacletos e nos neo-coisos de serviço, se quer envolver?

Defesa de Günter Grass

O homem em causa é daquele género pessoas que me metem medo: um moralista angustiado e sem sentido de humor. Posto isto, vir a saber-se agora que, na verdura da juventude, o sr. Grass acabou alistado pelas Waffen-Schutzstaffel da caveirinha, em lugar de me aquecer, arrefece-me.

Ademais, ensina aos bons cristãos uma parábola qualquer que há mais alegria no Céu pelo estróina arrependido que pelo penitente de toda a vida.

quarta-feira, agosto 16, 2006

O sexo dos anjos

Excertos de um artigo publicado na revista Atlântico, Agosto de 2006, da autoria de Tiago Cavaco:

«DARWIN E OS ESQUELETOS DA HUMANIDADE

No debate entre criacionismo e Evolucionismo, os darwinistas trocaram o velho barbudo que criou amorosamente o Planeta Azul [...] A sutentabilidade do enredo é precária e não cria empatia nos leitores. Nós participamos na discussão.

Não é bonito nem excitante descrever uma cronologia do debate entre o Criacionismo e o Evolucionismo. É contudo certo qual das duas teses chegou primeiro. [...]

A Europa sente em relação à América um vazio do tamanho de Deus.[...]

somente um Francês demasiado adormecido à sensibilidade religiosa do país mais competente do mundo (os EUA, os EUA) pode admirar-se com o vigor académico do Design Inteligente. [...]

sustentar o Design Inteligente não é o mesmo que sustentar a interpretação científico-literal do relato do Génesis. [...]

A minha abordagem [...] é a do testemunho. [...]

A partir desse momento sob a teoria da evolução pesou explicar como é que um macaco se faz um homenzinho. [...]

A resistência criacionista [...] foi reagregando-se. [...]

A década de oitenta [...] traz um novo plantel à equipa. E com orçamento reforçado (há quem acuse que os avanços criacionistas resultam de um financiamento suspeito por parte dos sectores americanos mais conservadores). [...]

o criacionismo do autor deste texto é objector de consciência. Não entra em guerras. [...]

Sou a pessoa errada para defender com competência a Criacionismo na imprensa respeitável nacional. [...]

Aos darwinistas não convém o optimismo. O planeta vai para o maneta por isso Deus deve ser despedido por incompetência grosseira. Quão mais ateu o espírito mais ecologista será. [...]

a certeza do esgotamento dos recursos naturais pressupõe a ineficácia da intervenção divina. [...]

Logo a responsabilidade permanece em exclusivo no discernimento humano e por isso o futuro é negro. [...]

ainda não é Al Gore o sustentador da atmosfera terrestre.[...]

O bom cristão deverá relembrar que é Deus quem ainda manda na geringonça. E que ela só avaria se Ele permitir. [...]

o que todos desejamos é vender as nossas teses sobre o Apocalipse. A única concórdia é sobre a necessidade de o guião colocar no último episódio muito pranto e ranger de dentes. Os fiéis pela via da impenitência dos pecadores, os darwinistas pela incontinência dos consumidores.

Os darwinistas arreliam-se. Com cada letra criacionista publicada, com cada dólar investido na defesa do Design Inteligente, com cada Liceu americano que ousa colocar o bom Charles lado a lado com o Bom Deus. Como contornar o facto de que os darwinistas se têm tornado nas últimas décadas pessoas apreciavelmente desagradáveis? [...]

O darwinista é o que sobra de um Hobbes sem crença na Eternidade. A melhor pedagogia para os darwinistas não é sequer convertê-los aos cristianismo. Ensiná-los a divertir-se já seria óptimo. Descontrair. Respirar fundo. Enquanto há ar.

O darwinismo começa a soçobrar [...]»

O revivalismo xiíta (*)


Vicente Jorge Silva mostra-se surpreendido, no DN de hoje, com o facto de até a Time, ('insuspeita', de facto) opinar que a concertação entre Hamas, os vários Hezbollah que para aí há e a Al-Caida é apenas aparente e nada tem a vêr com terrorismo.

De facto, é infelizmente costumeiro para os ocidentais remeter a origem dos conflitos no mundo muçulmano para os tais "reais ressentimentos islâmicos" da propaganda anti-americana. Costumeiro e conveniente para ambos os lados: o "nós contra eles" não requer explicações e acelera decisões. Pelo contrário, analisar instala a dúvida, inimiga da acção.

O que na revista americana se aflora é o que em outras publicações apesar de menos visíveis é discutido com maior nitidez: no xadrez da região as agendas dos vários poderes diferem bastante entre si e a imagem de um Islão unido contra o Grande Satã serve principalmente a quem se quer impor como líder da putativa união.

Esta estratégia do inimigo exterior não começou com Nasser ou outros nacionalistas árabes; muito antes disso, foi no cisma que empurrou sunitas e xiítas para uma luta pela supremacia religiosa (em que já califado e o sultanato se confundiam) que encontrou a sua origem. Mas a vantagem de que os sunitas gozaram até hoje, que em muitos casos, se traduziu em opressão da seita minoritária, tem vindo a ser ameaçada. Existe um ressurgimento xiíta que, embora até possa encontrar paralelo na revolução iraniana de '79, nunca até agora conseguiu extravasar as fronteiras do estado persa, ao que não é estranho o facto de nos países tradicionalmente inimigos de Israel a maioria da população ser sunita (como sunitas também são os árabes da Palestina e do Hamas, pelos quais Teerão só chora quando lhe convém).

No jogo de influência sobre os milhões de almas que habitam o espaço muçulmano não ganha quem infligir mais derrotas militares aos E.U.A. e os seus aliados. Para ganhar a liderança basta mostrar iniciativa e capacidade de enfrentar o inimigo, pois a manipulação das emoções dos "ressentidos" já é exercício de poder de facto.

Na guerra actual, tal como durante séculos na Europa (onde também a religião comandava a vida), o combate é, antes de mais, pelo pragmático título de "Defensor da Fé".

foto: George W. Bush e o seu aliado sunita, o rei Abdul da Arábia Saudita, em Crawford, Texas (Associated Press, 2002)
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(*) título roubado ao livro de Vali Nasr, The Shia Revival: How Conflicts Within Islam Will Shape the Future , W W Norton & Co Ltd (2006)

Os Florentinos

Agora que toda a gente já sabe que 'tudo não passou de um plano', repito o que já havia escrito a 27 de Julho, 'inda a guerra corria célere e ninguém falava nas Sheebaa Farms...

(...) não há qualquer sinal de radicalismo com perigo de ascensão em Israel. Pelo contrário, as reacções israelitas seguem uma lógica, maquiavélica talvez, mas puramente militar.

O objectivo israelita é bastante concreto: "limpar" tanto quanto possível a zona de bases do Hezbollah e obrigar a comunidade internacional a legitimar a reocupação de parcelas do sul do Líbano para que aí se reestabeleça um perímetro de segurança ao norte (1).


Nas próximas semanas veremos quem de facto ganhou a guerra.

terça-feira, agosto 15, 2006

Olhó choque de civilizações que para aí vai

Muito pela mão do rei Maomé II, os marroquinos têm visto surgir em debate as leis que pretendem reformar o estatuto da Mulher e da condição familiar naquele país muçulmano. É mais um dos projectos a realizar num processo de democratização lento mas firme e que, ao contrário de outros países mais a sul ou a levante, promete vir a tornar-se bem-sucedido.

Ao mesmo tempo, no Reino Unido, e no rescaldo do susto de quinta-feira passada, várias organizações islâmicas moderadas acabam de sugerir à Secretária para as Comunidades Ruth Kelly que, entre os seus, venha a ser permitido [ou reconhecido?] o estabelecimento da lei islâmica no que concerne ao casamento.

"É preciso mostrar aos jovens que o nosso país respeita a sua religião e assim evitar que caiam facilmente na propaganda daqueles que pretendem a sua radicalização".

Os líderes muçulmanos contudo ressalvam que, apesar desta subtracção ao direito civil de todo o pai de família que queira manter a mulher ou a filha com rédea curta, não é do seu intuito a futura imposição da sharia como substituto do código penal britânico.

Pessoalmente, não sei se valia a pena tanta contenção; uma inglesa que um dia se visse no risco de ser passada a fio de espada podia sempre refugiar-se num sítio mais civilizado. Como por exemplo, Marrocos.

segunda-feira, agosto 14, 2006

Dos blogues dos outros

No Dolo Eventual:

A machadada politicamente correcta
(...)
É politicamente incorrecto fumar, nem que seja fechado em casa. É uma coisa que nos torna piores pessoas, com dificuldades de discernimento mental grave, que se nos colocam sempre que temos de decidir entre um cigarro, ou a necessidade imperiosa de salvar uma criança pendurada de um penhasco que ameaça ruir a qualquer momento.
Para a UE todos nós fumadores iríamos decidir pelo cigarro e isso torna-nos cidadãos a perseguir.

É uma lógica de esforço comum da sociedade. Na realidade eles gostam de nós e querem integrar-nos. Querem poder novamente contar connosco nos cafés e restaurantes que entretanto deixámos de frequentar porque não se podia lá fumar.
Por isso é natural que as empresas nos desconsiderem (eu queria mesmo dizer discriminem, mas deve ser ilegal) e prefiram aqueles grandes malucos que comem o iogurte com bifidus activus com a colher da sopa, fazem corridas de cadeiras ou que têm a audácia de misturar café normal com café descafeinado, lá no escritório. Esses sim sabem viver sem fumo...

Esses sim, são os que vivem no verdadeiro perigo, e é dessa gente criativa que as empresas precisam, e não de gente como nós que fuma que nem cavalos, que vai morrer mais cedo, que não vai cumprir os mínimos olímpicos da segurança social, e logo não vai ajudar no futuro de algum filho da mãe de um preguiçoso que pode muito bem ainda nem ter nascido.

Prometo que se precisar de ir a alguma entrevista de emprego no futuro, me vou pintar de preto, insistir que tenho 82 anos, que sou uma traveca hindu, mas que não fumo.... só para ver se alguém tem coragem para me discriminar.

sábado, agosto 12, 2006

Um corno em África

Desde a queda do regime marxista de Siad Barre que a Somália é um país faminto e ingovernável. A confirmá-lo, as saídas de sendeiro do contingente de marines norte-americanos (primeiro sancionado e mais tarde substituído pelas Nações Unidas), em 1995, após dois anos de numerosas baixas e total fracasso nos seus respeitáveis objectivos: auxílio humanitário à população; desarmamento dos vários senhores da guerra que aterrorizavam o país e estabelecimento de um governo federal que unificasse os vários territórios entretanto em estado de autodeclarada "independência".

E nunca mais se ouviu falar daqueles desgraçados. Até que...


Em Junho deste ano a "capital", Mogadíscio, suportou uma batalha sangrenta entre uma espécie de "frente unida" dos fora-da-lei que haviam anteriormente combatido as N.U. e o novo poder em ascenção: as milícias islamitas do Conselho de Tribunais Islâmicos (a única forma de lei dos últimos 15 anos). Os antigos senhores da guerra, apesar de agora serem apoiados pelos E.U.A. (!), acabaram por perdê-la.

As milícias islâmicas, que desde sempre apoiaram as acções da Al-Caeda, partilham desde então com os restantes senhores da guerra não só o controlo do território somálio como o desprezo pelo governo federal interino do presidente Abdillahi Yusuf e do primeiro-ministro Mohamed Ghedi.

Entretanto, alguns jovens foram abatidos a tiro por se encontrarem a assistir às cerimónias de abertura da Copa do Mundo de Futebol. O futebol foi então proibido. Filmes considerados "maléficos" também.

Numa tentativa de evitar que o frágil governo interino fosse de facto derrubado (e não só por isso, claro...), a Etiópia fez entrar as suas tropas no país, o que levou os islamitas a suspender as negociações anteriormente encetadas enquanto houvesse militares estrangeiros presentes em território nacional...

A intervenção fez unir os somálios em torno do Conselho de Tribunais Islâmicos e prevê-se agora uma guerra "oficial" entre a Etiópia e a Somália. O governo provisório é para esquecer e os vizinhos quenianos temem o alastrar do conflito e do fundamentalismo para o seu próprio território e clamam por uma intervenção estrangeira.

Faz lembrar algo?

O número da semana

13,000 é o número de madraças no activo no Paquistão.

Grande parte destas escolas religiosas prega a jihad aos seus estudantes. Os estrangeiros acorrem em massa e muitos desses são cidadãos britânicos que vieram "visitar a família".

quinta-feira, agosto 03, 2006

Ainda a República Democrática do Congo


Mesmo na improbabilidade de que os senhores que irão ganhar as eleições naquele país (só daqui a algumas semanas se saberá quem) venham a visitar esta humilde tribuna, deixo aqui um conselho amigo: façam um favor ao vosso sofrido povo e tirem lá o 'democrática' do nome da república. Está mais que está provado que dá azar.

foto: contagem dos votos em Kinshasa, 31 VIII 2006, via BBC News

A propósito de números


Paulo Gorjão vem falar aqui da propaganda feita pelos lados em conflito no Líbano à volta da divulgação de números de vítimas, acabando por evidenciar a completa incoerência da opinião pública ocidental na posta seguinte.

De facto, há guerras que dão para o espectáculo televisivo e conversas de café, principalmente quando há potências mediáticas metidas ao barulho. Outros conflitos existirão - alguns dos quais envolvendo os "povos esquecidos" de que falava em tempos o prof. Adriano Moreira - onde, por via da insignificância estratégica ou material, ou por conveniência dos estados, as câmeras não agigantam os mortos e só os próprios choram por aquele terço de crianças.

Por causa das eleições no domingo, vem-me agora à cabeça o antigo Zaire. Podia argumentar-se que a cobertura dada ao longo dos anos aos acontecimentos no Zaire/República 'Democrática' do Congo tem sido mais do que suficiente para a tomada de consciência do público sobre a desumanidade ali reinante.

Para onde quer que se olhe na história do país, os números são impressionantes: só de 1885 a 1908, e enquanto propriedade privada do rei Leopoldo II dos Belgas, dez milhões de congoleses morreram vítimas da exploração colonial.

Mais recentemente, e mesmo já depois da deposição do carniceiro Mobutu, quatro milhões de pessoas viriam a morrer, vítimas das guerras e perseguições em que o país se viu mergulhado entre 1994 até domingo passado.
Isto, só nos últimos dez anos, dá qualquer coisa como dois terços de holocausto nazi (uma unidade de massacre tão válida como qualquer outra) a passar-nos à frente dos olhos na era dos blogues e das guerras em directo. Ao contrário dos 28 mortos de Caná, não chegou para nos impressionar.

No passado dia 30, finalmente, os congoleses foram a votos nas primeiras eleições multi-partidárias de sempre realizadas no seu país. Para trás, espera-se, ficou um dos passados mais sangrentos de qualquer percurso africano em direcção à democracia.

Iguais ao Congo, existem inúmeros conflitos e estados autoritários numa permanente produção de vítimas em boa parte do nosso planeta. Como agora até parece mal não dizer, "muitas delas são crianças". Porque sim, irei tentar neste blogue fazer um esforço despretencioso para lembrá-los, quantificando quando possível as terríveis consequências na "população civil", sem qualquer preocupação de periodicidade ou ordem de putativa importância.

Foto: "Pol Pot's Art", Steeve Gosselin, 2003

terça-feira, agosto 01, 2006

Intervalo da guerra

(ou nem por isso)

A cadeia de electrónica a retalho britânica Currys vai começar a vender ao público painéis solares para conversão doméstica de energia eléctrica.

Com umas formidáveis 3.87 horas diárias de sol (média anual), o Reino Unido torna-se o primeiro país a colocar à disposição do consumidor final, e em troca de GBP 1000 (menos de 1500 Euros), a hipótese de poupar algum dinheiro a si próprio, bastante ao país em particular e uma quantidade apreciável de fósseis ao mundo em geral.

Pena é que em Portugal chova tanto. De qualquer modo, aquilo faria o telhado tão feio.

Morrer em Bagdad

A mantança diária no Iraque não é generalizada, ao contrário do que se podia pensar. Os grupos armados sunitas e xiítas que semeiam o terror no dia-a-dia iraquiano são bastante específicos na escolha das suas vítimas civis. Isto levou a que população de Bagdad, num esforço de habituação a esse quotidiano, tenha encontrado formas de normalizar o absurdo dos assassinatos dando-lhes rótulos apropriados. Alguns exemplos escolhidos aleatoriamente, e sem qualquer preocupação de precedência:

-Morto pelo Pão. Os padeiros são considerados inimigos do Islão porque fornecem esse alimento às forças policiais. As padarias são um dos sítios preferidos dos atentados bombistas.

-Vítima da Moda. É difícil sair à rua em Bagdad com qualquer trapinho. O encarnado está proibido por ambas as guerrilhas islâmicas; calções, t-shirts, e camisas com padrões também; qualquer peça de vestuário minimamente americanizada (jeans, ténis) equivale a pintar um alvo na própria cabeça.

-Vítima da Escola. Segundo os radicais xiítas, as mulheres não podem receber instrução. Todas as famílias que permitem às suas crianças do sexo feminino ir à escola estão sujeitas a intimidações e, em já alguns casos, a várias balas.

-Morto pela Barba. Outro paradeiro comum de bombas. A barbearia é uma profissão de risco pois os barbeiros, lá está, fazem a barba e não pode ser porque as barbas são sagradas. Empunhar uma gillette é um convite ao petardo.

E os americanos? Por absurdo também vão morrendo, por absurdo também vão matando.
O praça Steven D. Green, acusado da violação e homicídio de uma criança de 14 anos e da morte de todos os membros da família dela, disse a quem quis ouvir que "no Iraque, matar pessoas é como pisar uma formiga, quero dizer, mata-se alguém e é tipo, 'Ok, vamos comer uma pizza'".